sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Promessas e renúncias - Mudamos o tempo inteiro. Mudam nossas vontades, pontos de vista, carga pessoal; mudam nossos sonhos, caminhos, projetos. Nesse cenário mutável por excelência, como manter uma promessa acerca de algo que não temos controle, algo que hoje "é" mas, amanhã, pode não ser mais? Inconcebível. Não estou invocando um discurso irresponsável, de um pai que promete amparo ao filho e descumpre, de uma esposa que promete levar as crianças à escola e não leva; promessas objetivas, concretas, éticas, proporcionais. Estou me referindo a promessas sobre aspectos da nossa natureza que são puramente abstratos e subjetivos. Como prometer a você o meu amor? Como prometer minha amizade eterna? Isso não faz sentido e não tem a mínima lógica se levarmos em conta a essência da nossa verdadeira natureza. Somos mutáveis. Podemos até optar por não manifestarmos nossas mudanças crônicas. Mas não poderemos impedi-las. A frustração que o choque entre as mudanças e a realidade traz precisa ser levada em conta. Quanta gente renuncia a vida inteira para cumprir uma promessa feita com fundamento em variáveis para lá de questionáveis. "Não prometer" é o mais sensato, mas cada um sabe o quanto deve se anular para manter uma promessa. Também é válido fazer isso, anular-se? Claro. Em se tratando de ser humano, nenhuma opção é descartável. Há muitos valores envolvidos em qualquer temática humanista. No contexto da análise "se uma quebra de promessa vale a pena", o homem aprecia o seguinte choque de princípios: de um lado, o peso da sua promessa; do outro, quanto valerá abrir mão dela. Cada um só pode responder por si. A pergunta é: qual é a relação custo-benefício do seu ato? Seu ato aproveita à felicidade de quem? Se a sua felicidade não estiver incluída na resposta a essa pergunta, há algo de errado nisso. Se seu ato só aproveita à felicidade alheia, mas não considera em absoluto a sua, discordo dessa renúncia.
"Equívocos são proveitosos e não vergonhosos." disse um amigo. E que frase!
Quanta vergonha e humilhação já foram impostas às pessoas que vivem em contextos religiosos com o argumento de "correção divina". Verdadeiras "Inquisições da Alma", aonde não se queimam corpos, mas destroi-se coisas tão importantes como autoestima, respeito, dignidade. Exposição gratuita, fruto de puro sadismo. Não me conformo com a exposição do erro, a invasão de privacidade, a crítica cínica de quem pensa saber o que o outro vive e não faz a menor idéia disso, porque sequer tem condições de se colocar no lugar do outro. Erros são erros. E ponto final. Os piores erros podem vir a ser as principais pontes para os maiores acertos.
Quanta miséria já foi feita nessa terra em nome de um Deus. Qualquer criança recém alfabetizada que tiver a oportunidade de ler os Evangelhos consegue compreender quão leve era a mensagem neles contida. De onde vem, então, tanta carga? Vem da mente de quem não consegue lidar com suas próprias insanidades e distorce o discurso para manifestar por meio dele sua própria loucura. Jesus era humanista. Isso quer dizer que ele entendia o homem, compreendia suas limitações, sabia lidar com a natureza humana e seu discurso foi para a humanidade. Quem se diz discípulo de Cristo deveria se preocupar em seguir seu Mestre aprendendo mais sobre a natureza humana, sua própria natureza e objeto do amor de Jesus e não investir suas horas e dias em discursos que falem de castigo, punição e julgamento. Quanto desgosto deve residir no coração de alguém que passa os dias almejando que almas sejam punidas.  
Como me enojam os dogmas. Quanta ingenuidade no ato de empurrar a nossa própria natureza pra "debaixo do tapete" e se esconder atrás de dogmas achando que ela vai mudar; ou ignorá-la, julgá-la demoníaca e, por isso, ridicularizar a essência do que somos. A natureza não muda. Negar suas nuances só atrapalha a compreensão do que ela é, até onde ela vai, do que ela é capaz e o que podemos fazer com clareza e racionalidade para lidar com ela. Proponho um tratamento puramente frio e racional da nossa natureza e suas manifestações, sem entregar a autoria de todos os nossos erros a seres de outra dimensão, cuja existência sequer podemos provar. Somos nós os únicos responsáveis pelos nossos atos. Quanta falácia no discurso transcendente que busca nos colocar o medo do que somos e nos enclausurar todos em dias em um quadrado para lutar contra o que somos, como se nossa natureza fosse uma miséria completa e nós não fôssemos autores dos nossos atos. Nossa natureza é o que somos e é TUDO o que somos! Se não posso amar o que sou, lidar com o que sou, se sou obrigada a sofrer diuturnamente pelo que sou, não vejo sentido em amar a vida ou sequer em ter nascido. Amo a vida. Nossa natureza é fantástica e tem muito a nos ensinar, principalmente quando erramos e aprendemos a compreender o PORQUE dos nossos erros com a  razão e não com divagações transcedentais. Assumir nossos erros faz parte desse processo. E compreendê-los é essencial para o nosso crescimento. Não é entregando a autoria dos nossos erros a outros seres que vamos entender quem somos de fato e aprender a lidar com o que somos.